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No Episódio De Hoje:

Neste episódio importante iremos questionar e contestar:

  • O documentário What The Health no Netflix causou um grande bafafá nas pessoas que desesperadamente nos inundaram com perguntas e pedidos de comentários. Neste episódio abrimos as cortinas dele para te mostrar realmente o que está por trás e qual a credibilidade que ele merece.
  • Falamos de ovos, colesterol, gorduras, problemas cardiacos, veganismo, vegetarianismo, etc.
  • Nada tem mais força do que a verdade e nós esperamos pode ter compartilhado ela com você para que você possa tomar suas próprias decisões.

Espero que aproveite este episódio ?

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Ouça o Episódio De Hoje:

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Transcrição do Episódio

Rodrigo Polesso: Olá. Bem-vindo para você. Você está ouvindo o episódio número 68 da Tribo Forte, o podcast número 1 do Brasil em saúde. Hoje vamos focar inteiramente em um assunto do qual você deve ter ouvido essa semana. Deu muito bafafá. Antes de começar a falar sobre isso, quero falar uma frase. “Polarização afeta famílias e grupos de amigos. É uma situação paralisante. Um guerra civil de opinião.” Quem falou isso não foi um filósofo antigo da Grécia, mas sim o Mick Jagger. Acho que essa frase introduz bacana o nosso assunto de hoje é o último documentário da Netflix, o “What the Health”. Muita gente deve ter assistido. A gente recebeu uma avalanche de mensagens da comunidade pedindo para a gente comentar sobre esse documentário que saiu. O que tem de verdade, o que tem de mentira. A gente resolveu devotar esse podcast praticamente inteiro sobre isso. Se você não sabe o que é esse documentário e não ouviu falar sobre ele, você ainda vai tirar muito proveito daqui porque vamos falar de ciência, mitos e verdades. Você com certeza vai tirar proveito para vários aspectos da saúde. Antes de começar, quero fazer um disclaimer. Quero dizer que nós não somos absolutamente contra documentário nenhum. Nós não somos contra veganos e vegetarianos, e suas filosofias alimentares. Nós somos contra enganação e má ciência. Nós estamos aqui para nos certificarmos de que você tenha acesso à verdade… à boa ciência… Para que você possa tomar suas decisões de acordo com o que faz sentido e não de acordo com interesses, politicagem e balelas. Sobre esse documentário “What The Health”, que apareceu no Netflix… Muita gente no Brasil já está vendo. É um documentário vegano, logo ele é bem polarizado em sua opinião. Isso bate bem com a frase com a qual abri. Esse documentário foi criado pelos mesmos criados do “Cowspiracy”, que vocês devem ter assistido também na Netflix. É o mesmo diretor, o Kip Andersen. Ele acredita que o cultivo de gado é praticamente a razão de todos os problemas na Terra. Quem realmente entende do assunto pode realmente desmontar esses argumentos e mostrar que o que ele defende pode ser o maior problema. Mas esse é um assunto para outra hora. É só para você entender que ele é uma pessoa que defende esse tipo de filosofia e está por trás por esse documentário. Como é de costume em documentários, você entrevista vários experts. Mas se você é uma pessoa totalmente polarizada, você tende a selecionar experts que corroborar contigo. Dois exemplos notórios de experts que participaram desse documentário… O primeiro é o Dr. Garth Davis. Ele é o autor de um livro que diz que o hábito de comer carne está nos matando. Isso, você já deve saber, que é comprovadamente falso. Outra estrela negra é o Dr. Neal Barnard. Ele é vegano e publicou vários livros sobre isso. Um deles tem o título que é: “Quer ser saudável? Seja vegano.” O Dr. Souto já falou desse Neal Barnard antes. Você pode falar pelo o que ele é conhecido? Claro, bem-vindo a esse podcast de hoje.

Dr. Souto: Obrigado. Boa tarde, Rodrigo. Boa tarde aos ouvintes. Foi uma avalanche de emails. Vou uma avalanche de comentários no blog. Isso me deixou curioso. Eu acho que as pessoas estão muito preocupadas. As pessoas devem estar com aquilo que já comentamos aqui… Aquele medo. “Eu devo estar fazendo algo errado. No fundo eu sei que isso que estou fazendo não me faz bem. Afinal, falam na televisão que não faz bem. Determinado médico disse que não faz bem. Quando aparece um documentário desses, “Eu sabia que não devia ter embarcado nessa. Todo mundo me dizia.” Existe esse componente psicológico.

Rodrigo Polesso: Sim.

Dr. Souto: O Barnard… Ele é membro desse Comitê de Médicos para a Medicina Responsável… algo assim. É uma sigla em inglês. Na realidade, é um grupo vegano. Eles colocam outdoors nas estradas dos Estados Unidos dizendo que ovo mata. Colocam outdoors dizendo que carne mata. O Barnard nós citamos num podcast anterior para dizer que ele foi encontrado fazendo um piquete com cartazes na entrada de um festival de bacon. Quando nós dizemos que ele é um ativista de uma causa, não estamos exagerando, ironizando. Ele é um ativista. Ele é um médico que se presta a pegar um cartaz… E convocou via internet as pessoas que quisessem ir lá protestar contra aquele absurdo, que era o festival do bacon. A graça é que foram o Barnard e mais 6 só. O importante é quem está nos ouvindo entender que para nós, quando estamos falando de nutrição, vida saudável, estamos tentando buscar… De acordo com a evidência científica aquilo que for o melhor para a saúde. Nada impede que surjam novas evidências… Um novo ensaio clínico randomizado mostrando que temos que modificar nossa orientação num sentido ou noutro. A situação do Barnard e da instituição – que acredito que ele até presida – é diferente. É um grupo de advocacia em favor de uma causa. Não existe nenhum dado científico que vá fazê-los mudar de ideia no sentido do veganismo, porque essa é uma posição filosófica deles. É moralmente errado, na visão dessas pessoas, o consumo de animais. O que eles estão buscando não é necessariamente a verdade, não é necessariamente um equilíbrio no seu discurso. O que eles estão buscando é toda e qualquer evidência possível, de qualidade boa ou ruim, mas que se encaixe com sua posição filosófica e apriorística de que nós não devemos consumir animais. Isso tem que ficar bem claro para quem assistir esse documentário. Esse é o Dr. Barnard. Um cara que faz piquete.

Rodrigo Polesso: Exato. Novamente vale dizer que não sou contra nenhuma filosofia alimentar. Somos contra sim má ciência. Quando a má ciência acontece, acaba popularizando uma mensagem para a população em massa. Quando isso acontece, acabamos ficando P da vida. A partir de agora podemos falar sobre alguns pontos deste documentário.

Dr. Souto: Vou até pegar um gancho nisso que você falou. Eu tenho plena consciência de que é possível fazer uma dieta vegetariana extremamente saudável. Esses dias eu estava tendo uma breve discussão no Twitter com um autor americano. Eu estava dizendo que um determinado estudo que eles colocaram que mostrou que uma dieta low carb e uma dieta de restrição calórica foram semelhantes… Sempre com aquele mesmo viés. Ambas tiveram exatamente o mesmo número de calorias. Eu disse para ele aquilo que já comentei aqui no blog. É a mesma coisa que pegar uma Ferrari e um Fusca e dizer que eles são iguais, mas a corrida tem um limite de velocidade de 30 quilômetros por hora. Se você restringir as calorias dos dois e fazê-las ficarem iguais, aí você pode inferir que elas são parecidas. O cara disse que não importava ser low carb diet, mas sim “low crap diet”. Como esse é um podcast de respeito, não vou traduzir isso literalmente, mas é uma “dieta sem porcaria”. Então, uma dieta vegetariana pode ser uma dieta muito boa, se ela for bem orientada por um nutricionista para não haver nenhuma deficiência. E se ela não for vegetariana com porcaria, afinal pão é vegetal, ketchup é vegetal, Coca-Cola é vegetal. Então, a gente pode fazer uma dieta vegetariana com porcaria o uma dieta vegetariana sem porcaria. A gente pode fazer uma dieta low carb sem porcaria e uma dieta low carb com porcaria. Só para reforçar o que o Rodrigo disse. Não se trata de demonizar o vegetarianismo. Deste lado, meu e do Rodrigo, vocês vão ouvir que uma dieta vegetariana pode ser boa. Mas vocês jamais vão ouvir isso do outro lado… Pelo menos do outro lado por essa organização representada pelo Barnard, que é o sujeito principal desse documentário. Para ele é uma questão religiosa.

Rodrigo Polesso: Exato. Para começar… A partir desse momento quero pedir permissão para ser menos polido e mais enfático. Dou permissão para você também, Dr. Souto. Também dou permissão para ser mais enfático, como quiser. Eu realmente acho que a situação requer isso. Parece que uma das coisas ditas no documentário é que o expert entrevistado diz que gorduras causam diabetes. Tenho duas perguntas. O que ele fuma no dia a dia? A segunda pergunta é em quais estudos eles se baseiam? Aqui vale uma ressalva. Estudos científicos imaginários não contam. Dr. Souto, sabemos que essa questão da diabetes é uma coisa antiga. Antes de partir para partes mais específicas nesse documentário… Que eles pisam na bola também, você pode dizer porque essa ideia é falsa?

Dr. Souto: Seja lá o que for que ele fuma, é vegetal.

Rodrigo Polesso: Com certeza.

Dr. Souto: Da onde vem essa história… Houve um período nos 60 em diante em que tudo era culpa da gordura. Até a proliferação armamentista entre Estados Unidos e União Soviética devia ser culpa da gordura. Naquele momento, gordura engordava. Hoje em dia a gente sabe que é o contrário. Ninguém tinha se quer tinha feito um experimento, um ensaio clínico. As pessoas simplesmente afirmavam que gordura engordava. Gordura estava relacionada com câncer, gordura dava doença no coração. Aí o pessoal começou a fazer ilações baseadas em mecanismos. É sempre uma coisa muito perigosa. Veja bem… Existem vários mecanismos potenciais que podem explicar coisas muitas vezes antagônicas. Só uma das coisas será verdade. Muitas vezes determinados mecanismos até deveriam ser reais… Poderiam explicar determinados fenômenos simplesmente não existe. Vamos pegar um exemplo bem simples. Daqui há pouco tenho um modelo climático para fazer previsão do tempo. Eu posso explicar tim-tim por tim-tim. A temperatura da atmosfera mudou assim… A pressão mudou assado… O vendo mudou assim… Vai chover amanhã. Se meu modelo sempre dá a previsão errada, esses mecanismos até podem existir, mas tenho que mudar meu modelo. O que interessa é se choveu ou se não choveu. Vou fazer um disclamier. Eu não assisti o documentário. Tem coisas que não tenho mais paciência. Eu fui informado pelos leitores de muitas coisas que foram ditas lá. Uma das coisas ditas é que gordura acaba produzindo resistência à insulina no músculo. Rodrigo, pasme, isso é verdade. A gordura pode sim provocar resistência à insulina no músculo. Agora, esses estudos costumam ser estudos em voluntários… Estudos de curtíssima duração. Por exemplo, dou uma dieta rica em gordura e meço a resistência à insulina antes e depois. Provisoriamente, depois dessa refeição rica em gordura, a resistência à insulina aumenta. Dizer que, por isso, a gordura na dieta causa diabetes… então, vou dizer que exercício físico causa diabetes. Quer ver como? Se eu pegar um atleta de crossfit e medir sua glicose logo depois do exercício, periga ela dar mais alta do que antes.

Rodrigo Polesso: Com certeza, com certeza.

Dr. Souto: Diabetes não está relacionada com glicose alta? Sinal que exercício causa diabetes. Não é assim que funciona. Quando o cara faz um exercício super intenso, ele libera tanta adrenalina, tanto cortisol, que ele aumenta os níveis de glicose. A glicose que é usada pelo corpo justamente para dar condições de fazer esse exercício intenso. Depois, no resto do dia, quando ele não está fazendo exercício intenso, a sensibilidade à insulina, pelo contrário, melhora muito. A glicose, pelo contrário, baixa bastante. Mesmo que agudamente alguma coisa que a gente faça modifique a resistência à insulina…

Rodrigo Polesso: Momentaneamente…

Dr. Souto: Isso é mecanismo. Como que a gente vai testar? Vamos fazer um ensaio clínico randomizado e ver se as pessoas que fazem exercício ficam com a resistência à insulina melhor, com a diabetes melhor, com a hemoglobina glicada melhor. A resposta é: sim, elas ficam. E aí, pessoal, será que existe algum ensaio clínico randomizado que mostra que uma dieta low carb melhora o diabetes? Existem um monte. Chuta uma moita na esquina e tem três ensaios clínicos randomizados mostrando que dieta low carb melhora diabetes. Quem estuda mecanismo tem que entender que a realidade tem primazia sobre os mecanismos. A realidade deste universo que começou com o Big Bang há 13,8 bilhões de anos. Talvez outro universo onde o Barnard more e fume seja diferente. Mas neste aqui a dieta low carb melhora o diabetes, melhora a hemoglobina glicada, permite que vários pacientes deixem de usar remédios para diabetes. Permite, inclusive, que alguns diabéticos tipo 2 deixem de usar insulina. Uma dieta low carb é uma dieta que tem mais gordura do que uma dieta low fat. E uma dieta low carb não é sem carne. Então, vou perguntar, Rodrigo. O Barnard disse que carne e gordura (especialmente) causam diabetes. Como que carne e gordura podem causar diabete se uma dieta low carb, que é mais rica em carne e gordura, cura diabetes? Como que pode isso, Rodrigo?

Rodrigo Polesso: Exato. Só não usando o cérebro para chegar nessa conclusão. Essa é a única forma que faz sentido.

Dr. Souto: O sujeito é um advogado de uma causa.

Rodrigo Polesso: Polarização irracional.

Dr. Souto: Exatamente. É diferente de uma pessoa que entra na jogada com um objetivo de descobrir a verdade. O advogado de uma causa já tem a sua verdade na mão. Eu sou um advogado criminalista e tenho aqui meu cliente. O meu cliente disse que não matou. Se ele matou, se ele não matou… É problema do juiz. Ele, o meu cliente, disse que não matou. A minha verdade e a verdade do meu cliente é que ele é inocente. Vocês entendem a diferença? Se ele é inocente ou não, não entra nessa discussão. Para mim, que sou o advogado dele, ele é inocente. Eu não vou atrás da verdade. Vou buscar toda e qualquer evidência… Todo e qualquer testemunho… Mesmo que seja um falso testemunho. Vou buscar toda e qualquer evidência, mesmo que seja uma evidência circunstancial fraca. Mesmo que seja um álibi questionável… Para tentar provar a inocência do meu cliente. O Barnard… Esse Centro de Médicos para a Medicina Responsável… Esse diretor desse documentário… Eles são advogados de uma causa. É isso que as pessoas têm que entender. Sim, é verdade aquilo que eles falaram que a gordura aumenta provisoriamente a resistência à insulina no músculo. Mas que importância tem isso para provar que eu tenho que fazer uma dieta low fat se eu já tenho ensaios clínicos randomizados mostrando que uma dieta low carb melhora e, eventualmente, reverte o diabetes?

Rodrigo Polesso: Certo. Perfeito. Nós mencionamos que eles têm uma polarização de opinião. E tentam coletar tudo o que podem para tentar corroborar essa ideia. É basicamente isso que fizeram. No que eu dei uma olhada hoje de manhã quando estava estudando sobre esse documentário? Se vocês entrarem na página do próprio documentário, vocês verão que eles fizeram várias imagens para serem compartilhadas na mídia social com as principais mensagens que o documentário passa. Cada uma delas tem a fonte que disse ela. Eu selecionei algumas para a gente falar quão tendenciosa é a mensagem deles. E porque é um ótimo exemplo de péssima ciência praticada. A primeira que eles colocaram é o seguinte: “Alto consumo de proteína animal foi associado com aumento de mortalidade. A substituição de proteína animal por proteína de plantas foi associada com menor mortalidade.” Aí eles colocam a fonte. Claro que vou olhar a fonte. Para começar, é um estudo de associação. Então, não mostra causa e efeito. O que o estudo de fato diz? Vou traduzir simultaneamente. “A ingestão de proteína animal não foi associada com mortalidade por todas as causas. Foi associada com uma maior mortalidade por motivos cardiovasculares. A proteína vegetal foi associada com uma menor mortalidade por todas as causas e mortalidade por problemas cardiovasculares. Essas associações foram confinadas a participantes com pelo menos um aspecto de estilo de vida não saudável, como fumar, beber bastante álcool, estar acima do peso ou obeso e ser uma batata de sofá (inativo fisicamente). Mas nenhuma evidência foi encontrada sem esses fatores de risco.” Não sei se vocês entenderam o que querem dizer. Basicamente disseram o seguinte… Em pessoas normais, sem estilos de vida não saudáveis, não existe nenhuma associação. A única associação que eles acharam foi em pessoas que têm hábitos como este que acabei de citar. É uma associação que é praticamente irrisória. É isso que diz o estudo. Em contrapartida, o que eles colocaram em destaque é que proteína animal aumenta a probabilidade por todas as causas. E o próprio estudo diz que não é verdade. É o primeiro exemplo de polarização irracional do estudo.

Dr. Souto: É o caso perfeito de um advogado montando a defesa do seu cliente. Seu cliente, no caso, é essa postura filosófica elementar que eles defendem.

Rodrigo Polesso: Colocando debaixo do tapete o que não ajuda e mostrando só o resto.

Dr. Souto: É. Acho que quem está nos ouvindo está acostumado… Mas só para citar bem rápido… Consumo de carne vermelha… Como carne vermelha foi demonizada por algumas décadas, as pessoas que comem carne vermelha são as mesmas que têm uma chance maior de terem uma série de outros comportamentos que colocam a saúde em risco. Mesmo que a carne vermelha seja o bálsamo da saúde, o resultado do consumo da carne vermelha nos estudos vai ser piora dos desfechos de saúde porque a pessoa tem uma chance maior de ser fumante, beber muito, não se cuidar, de ser obeso, de ser sedentário. É meio ridículo citar isso como uma defesa contundente e definitiva da coisa. Afirmar, “comer proteína animal mata”… Quando os estudos, quanto melhor eles são conduzidos, quanto mais bem feitos eles são, mais isso aí desaparecer. Até que os estudos altamente controlados para fatores de confusão mostram que não tem nenhuma associação. Então, eles escolhem os mais mal feitos.

Rodrigo Polesso: Não precisa ir nem tão longe. O que eles citaram… Ele mesmo se contradiz. Quer ver outro exemplo para a gente continuar com a diversão um pouco? Casais com maior colesterol total mostraram ter uma mais baixa taxa de gravidez ou demoraram mais tempo para se tornarem grávidos comparados com aqueles que tinham níveis mais baixos de colesterol total. Novamente eles citaram a fonte. Eu fui olhar a fonte. Novamente, é um estudo de associação. Só por isso já podia perder credibilidade. Para começar o primeiro erro é assumir que a ingestão de colesterol através da dieta… Eles são contra comer fontes animais… O principal erro é assumir que a ingestão de colesterol através da dieta aumenta significativamente o colesterol no sangue. Até o Ancel Keys reconheceu no passado que esse fato não era verdade. Mas isso foi muito pouco divulgado. Por isso que ele focou bastante na questão da gordura saturada em vez do colesterol no passado. O segundo erro é acreditar que o consumo de gordura animal é o que aumenta o colesterol. A gente sabe hoje que são carboidratos refinados (processados) que fazem isso com maior impacto. Por que não ler o que o estudo de fato diz? O estudo de fato diz o seguinte. “Uma análise de sensibilidade sugere que as associações observadas não são explicadas pela dieta alimentar.” O estudo fala isso. Não é piada. Na conclusão. Então, basicamente essa frase que o próprio estudo diz invalida imediatamente a frase que eles colocaram em destaque.

Dr. Souto: A propaganda é realmente a alma do negócio. Eles sabem. Quantos por cento serão um Rodrigo Polesso que vão lá olhar a referência?

Rodrigo Polesso: Esse que é o perigo.

Dr. Souto: Claro. O cara afirma uma asneira e bota ali uma referência. “Fulano et al”. “É embasado. Ele botou uma referência.” Sim, a referência diz o contrário.

Rodrigo Polesso: Agora uma outra um pouco mais sobre veganos. A mensagem que eles colocaram em destaque para o pessoal compartilhar é a seguinte. “Uma dieta vegana pode baixar o stress e os níveis de ansiedade de acordo com um estudo com 620 participantes.” O primeiro erro é que o estudo é associativo e o título implica causa e efeito. O segundo erro são os dados de péssima valia, uma vez que foram coletados dados de pessoas na internet em mídia social, especificamente em canais de dieta. Assim que eles coletaram informação. O que o estudo diz de fato? Uma dieta estritamente de plantas não apresenta nenhum impacto negativo no humor. É isso que eles falaram. Uma dieta vegana não causa impacto negativo no humor.

Dr. Souto: Até porque aqueles que estão extremamente deprimidos não conseguiram preencher o negócio na internet.

Rodrigo Polesso: Exatamente. Uma melhora no humor não foi consistente com os achados em outros estudos e isso pode ser por causa de diferenças de metodologia. Eles falaram para compartilhar com o pessoal que uma dieta vegana pode baixar a ansiedade e o stress. O que o estudo fala é que, se você é vegano ou vegetariano, não aparece associação alguma com a negativa de humor. Eles falam também que uma melhora de humor (que eu acho que eles esperavam que iria acontecer) não aconteceu, provavelmente por causa de diferenças metodológicas. Mais uma vez, o estudo diz uma coisa e eles resolvem escolher outra para divulgar. Tem outro bacana aqui. Essas são as mensagens principais que são passadas pelo documentário, para você entender a base das coisas, como ele foi feito. A frase é a seguinte. Indivíduos que consomem a maior quantidade de proteína animal tiveram um risco 22% maior de desenvolver diabetes tipo 2 comparados com aqueles que comiam menos proteína animal. De novo, mais estudo de associação. O que o estudo diz, de fato? Comparando-se as análises gerais as associações foram mais fortes em mulheres, mas especificamente em mulheres obesas e não acharam nenhuma associação significativa em homens. Essa é a conclusão. Não existe associação nenhuma em homens. A única associação entre proteína animal e diabetes tipo foi em mulheres obesas. Pelo amor de Deus.

Dr. Souto: Devem ter ficado obesas porque comeram muita carne, né, Rodrigo?

Rodrigo Polesso: Com certeza foi por causa disso.

Dr. Souto: Eu e você já ganhamos uns 10 quilos esse ano.

Rodrigo Polesso: “Olha só esse impacto grande. Você come proteína animal e tem 22% mais chances de diabetes tipo 2.” O risco assustador que eles tentam mostrar… Para você saberem de fato o que é… É que a ingestão de proteína animal supostamente foi associada com um risco 5% maior de diabetes tipo 2. Cinco por cento, pessoal. Agora vem a pegada. Enquanto a proteína vegetal também foi associada com risco, mas bem menor. Quatro por cento. Ou seja, não teve diferença nenhuma. Nem o que eles defendem, que é proteína animal… Ela também teve um risco aumentado de 4% e a carne teve de 5%. Ou seja, assumindo que isso tudo que eles falaram na mensagem for verdade… O que obviamente não é, tendo em vista o tipo e qualidade do estudo… Você viveria uma amarga e limitada vida, se privando de proteína animal para talvez ter 1% menos risco de diabetes tipo 2.

Dr. Souto: Se você for uma mulher e engordar.

Rodrigo Polesso: E for obesa. Exato.

Dr. Souto: É o exemplo típico daquilo que estamos falando. É o papel do advogado. Vou salientar só aquilo que funciona para o meu cliente. Proteína vegetal também aumentou o risco de diabetes… “Mas aí a gente não fala.”

Rodrigo Polesso: Aumentou quase tanto quanto o outro no estudo.

Dr. Souto: Nenhuma das duas aumenta nada. Tem ensaio clínico randomizado. A gente falou há vários podcasts atrás que era em pacientes pré-diabéticos. Eles foram randomizados e um dos braços era uma dieta de alta proteína e baixo carboidrato. Cem por cento dos pacientes randomizados para a dieta de alta proteína… Proteína animal, diga-se de passagem… Ficaram curados do status de pré-diabéticos. Quero entender como que uma coisa num ensaio clínico cura pré-diabetes… Essa coisa causa diabetes.

Rodrigo Polesso: Exatamente. Perfeitamente.

Dr. Souto: Associação não é causa e efeito. Vou ler uma coisa rápida. Eu sei que eles citaram no documentário o estudo EPIC – European Prospective Investigation into Cancer and Nutrition (Estudo Europeu Prospectivo sobre Câncer e Nutrição). Esse foi o maior estudo observacional de dieta já conduzido.

Rodrigo Polesso: Sabe qual é a fonte da frase que acabei de ler para você? É do EPIC.

Dr. Souto: Que espetáculo. Então vou ler e vocês vão gostar muito. Conhecido como EPIC – European Prospective Investigation into Cancer and Nutrition (Estudo Europeu Prospectivo sobre Câncer e Nutrição). Ele incluiu mais de 500 mil pessoas de 10 países diferentes que foram questionadas sobre um conjunto de diferentes fatores dietéticos, desde o que e o quanto comiam até seu nível de escolaridade, idade, peso, altura, e tabagismo. O estudo indicou que pessoas que comiam muita carne processada também tinham uma chance muito maior de fumar, comer menos frutas e saladas, e ter níveis mais baixos de educação. Eram muito mais gordos e se exercitavam muito menos do que o restante da amostra. E os homens que comiam mais carne processada bebiam muito. E os maiores comedores de carne eram também mais velhos – muitos já haviam passado dos 70 anos quando sofreram as consequências das salsichas. E as pessoas que comiam a maior quantidade de carne processada – que o estudo qualificou como mais de 160g por dia (equivalente a cerca de 6 salsichas) – não morreram apenas de doenças cardiovasculares ou câncer, as coisas que costumamos associar à uma dieta ruim; eles também morreram mais de “outras causas”, uma categoria que inclui acidentes de carro, ferimentos acidentais e outras causas não relacionadas à comida. Os maiores consumidores de carne branca, por outro lado, eram os “escoteiros” do grupo: não fumavam muito, comiam bastante salada, faziam exercício, iam à faculdade, e com certeza escovavam os dentes, usavam cinto de segurança e faziam seus check-ups regularmente. Então, é isso pessoal. Pelo amor de Deus. Que um leigo total não se dê conta disso, está bem. Mas esse cara que entrevistaram nesse documentário eu já ouvi ele debatendo no YouTube em inglês. Esse cara de bobo não tem nada. Esse cara é muito inteligente… o Barnard. Ou seja: é mal intencionado.

Rodrigo Polesso: Isso é pior ainda.

Dr. Souto: Exatamente. A pessoa que só estudou na faculdade de nutrição de repente não teve interesse de entrar no Pubmed. Talvez não domine o inglês. Aprendei aquilo que foi dado num polígrafo. Pode até ser. Agora, não é o caso do Dr. Barnard. Ele é um cara que conhece bem estatística. Ele é bom num sofisma, numa argumentação. Ele é o advogado ideal dessa causa. É com malícia que ele usa esses dados aqui. Isso tudo que eu falei para vocês é conhecido por qualquer pessoa que tenha a mínima noção de bioestatística.

Rodrigo Polesso: Sim, perfeito.

Dr. Souto: É um estudo observacional. Quando a gente compara os que mais comem carne processada com os vegetarianos, nós estamos basicamente comparando o tigrão beberrão tabagista gordão com a moça que faz ioga, super diferenciada, rica, da Califórnia, que toma seus suplementos, vai ao médico e faz 10 check-ups por ano. A culpa é a carne? A carne é um marcador de estilo de vida. Pelo amor de Deus.

Rodrigo Polesso: Eles também tiveram a petulância de demonizar ovos. A mensagem que eles escrevam foi a seguinte. Pessoas que consomem um ovo e meio por semana tiveram quase cinco vezes maior risco para câncer do cólon (câncer do intestino) de acordo com um estudo publicado no Jornal Internacional do Câncer. Impressionante. É um estudo observacional. Associação, novamente. É um estudo observacional de menor valia ainda, porque é um estudo caso controle.

Dr. Souto: Desculpa, Rodrigo. Caso controle é piada. Caso controle no máximo serve para levantar uma hipótese para ver se vale a pena levar isso adiante e estudar um pouco melhor em algum estudo que tenha alguma validade. Caso controle é tipo jogar o anzol na água para ver se vem peixe. “Veio peixe, então talvez tenha peixe nesse lago.” Desculpa interromper.

Rodrigo Polesso: A piada vem a seguir. O caso controle pega um grupo de pessoas e analisa o que elas fizeram no passado para desenvolver os problemas que elas têm hoje. Acho muito importante você entender o tipo de estudo, se você tiver interesse em nutrição. Você pode procurar no YouTube, no canal Emagrecer De Vez eu fiz um vídeo explicando de foram fácil como entender estudos científicos. Nesse caso, foi um caso controle. Eles pegaram 110 pacientes já diagnosticados com câncer e daí fizeram perguntas sobre o consumo de 140 alimentos nos últimos 5 anos. Então, alguém te para na rua hoje e vem com um questionário com 140 alimentos perguntando a frequência com a qual você comeu cada um deles nos últimos 5 anos. Parando por aqui, quão confiável você acha que são esses dados? Disso eles tiraram essa asneira dizendo que pessoas que consumiam um ovo e meio por semana tinham 5 vezes mais chances de câncer no cólon. Pelo amor de Deus, Dr. Souto. É difícil segurar a paciência.

Dr. Souto: Essas galinhas moravam em Chernobyl, eu acho.

Rodrigo Polesso: Cheio de cyanide dentro dos ovos.

Dr. Souto: É uma bobagem muito grande. O caso controle, como o Rodrigo disse, é assim… Pega 100 pessoas com câncer diagnosticados e pega outras 100 aleatórias que não tenham câncer e que sejam da mesma faixa etária e tal. Demograficamente parecidas. Aí perguntam o que fizeram e o que não fizeram. Obviamente isso é afetado… A pessoa que tem câncer começa a se culpar. Ela começa a pensar, “O que fiz de errado?” Então, ela tem uma chance muito maior de responder àquilo que o senso comum diz que é ruim. Isso é sabido. Essas são coisas que se estudam em epidemiologia. Não vale nada. Isso é ridículo. Alguns dos que estão nos escutando não sabem. É a primeira vez que estão ouvindo essa explicação. O cara que falou isso no documentário sabe. Ele está enganando as pessoas de propósito. Eu não estou irritado com a dieta vegetariana. Eu acho que a dieta vegetariana pode ser muito saudável. O principal low que tem que ser é o “low crap diet” a dieta da baixa porcaria. Se ela for vegetariana com baixa porcaria, excelente. Mas é a desonestidade intelectual que nos irrita.

Rodrigo Polesso: Perfeitamente. É má ciência.

Dr. Souto: É pegar qualquer argumento, por mais furado que seja… Mesmo que eu saiba que aquele argumento é furado… Mas eu vou usar para enganar as pessoas que sabem menos do que eu. Porque meu objetivo é fazê-las ficarem tão desesperadas… Se elas aderirem minha causa, mesmo que por motivos errados, o importante é que elas aderiram à minha causa. É para isso que serve esse documentário.

Rodrigo Polesso: O Dr. Barnard em particular tem vários livros vendendo a dieta vegana. Agora, para a gente acabar, o último exemplo que eu peguei… Eu podia fazer isso com todos, mas não precisa fazer com todos. Acho que essa amostragem deixou claro a qualidade da sustentação científica deste documentário. A última frase que vou falar aqui também é sobre ovos. Participantes que consumiram a maior quantidade de ovos tiveram 80% maior score de cálcio nas artérias coronárias. É uma medida de risco de doença cardíaca. Esse score de cálcio é quando você faz um CT scan do seu coração e você vê acúmulo de cálcio nas artérias. Isso é sinal de doença. Eles falam que participantes que consumiam a maior quantidade de ovos tinham 80% maior chance de ter um score de cálcio maior. É um estudo, novamente, de associação observacional. O que o estudo diz de fato? O estudo fala o seguinte. A associação positiva parece ser mais pronunciada entre os participantes que comem menos legumes, vegetais e aqueles com maior índice de massa corpórea. “A associação parece pronunciada.” Eu traduziria assim: a associação só existe em pessoas que tem péssimos hábitos alimentares e já são acima do peso. É assim que entendo o que eles falaram. Eles continuam. A associação foi atenuada e não mais significante depois de se ajustar para a questão do colesterol na dieta também. Ou seja. Eles fizeram um esforço grotesco para tentar achar uma associação e essa associação só existe nas pessoas que comem os ovos, quase não comem vegetais e que já são obesas.

Dr. Souto: Se nós entendermos da forma que falei da carne antes… O ovo sendo um marcador de non-compliance… Um marcador de pessoas que se recusam a seguir as coisas que dizem que elas têm que seguir. Quando todo mundo acha que comer ovo faz mal, quem come ovo é alguém do contra. Quando o estudo diz que o ovo fez mal, mas só fez mal nas pessoas que evidentemente são do contra… Ou seja, a pessoa que, por exemplo, não come vegetais. Ele é um marcador de non-compliance. É um marcador de ser do contra. É tão evidente isso. Isso quase da página com duas mãos te pega e te sacode. “Pelo amor de Deus, me veja. Eu sou a causa real.

Rodrigo Polesso: Exato. Pense assim. Uma pessoa que já está obesa e não come legumes nem verduras. Você vai dizer que a culpa de ela ter mais problema de ataque cardíaco é o ovo que ela come de vez em quando? Pelo amor de Deus. Eles usaram um estudo associativo. Se a gente quiser devolver na mesma moeda, a gente podia citar essa metanálise que foi publicada em 2013. Ela analisou vários estudos associativos de coorte também. A conclusão dessa metanálise que estudou exatamente o consumo de ovos e o risco de doença cardíaca e infarto. A metanálise conclui… Esta metanálise identificou nenhuma associação entre o consumo de ovos e o risco de doenças coronárias ou infarto.

Dr. Souto: É porque a metanálise pegou e viu todos os estudos. Esse pessoal aí, embora conheça essa metanálise, enfia ela de baixo do tapete e pega um estudo que é um ponto fora da curva… O estudo mais mal feito… Pega ele e usa para justificar sua posição filosófica sobre alimentação.

Rodrigo Polesso: Exato. Por que não finalizar essa questão com diversão? Vou citar um exemplo bacana. A mulher mais velha do mundo, supostamente… Saiu uma manchete na BBC… Faleceu recentemente com 116 anos. O que eles dizem nesse artigo da BBC é o seguinte. A senhorita Jones… O prato favorito dela é ovos e bacon. “A mulher de 116 anos comia bacon e ovos toda manhã. Sua dieta diária contém mais de uma porção de carne por dia.” Com a suprema inteligência deles, a BBC continua. “Você esperaria que ela sofresse diabetes tipo 2 e doenças cardíacas. E ainda, Susannah Mushatt Jones, precisou de nenhum tratamento médico. Todos os doutores concordaram que ela está em perfeita condição física apesar dos produtos que ela come.” Eles têm que ter a conotação negativa sempre. Estamos falando de um documentário polarizado feito por pessoas com fortes crenças veganas, que começam com hipóteses baseadas em evidências muito fracas… Focam em mecanismos intermediários e não em desfechos duros… Tentam provar seu lado. Todas as evidências sugeridas pelo documentário (até onde eu vi) são associativas observacionais. Sem dúvida, o maior viés de todos, como sempre acontece com estudos que comparam vegetarianos, veganos e onívoros é o estilo de vida ser um marcador do tipo de pessoa. Com isso, largo o microfone no palco.

Dr. Souto: Eu ainda não vou largar o meu porque ainda estou pilhado com esse troço. A epidemiologia… Os estudos observacionais… Eles não estabelecem causa e efeito. Ou já disse isso, mas gosto de dizer várias vezes. Mas, no entanto, contudo… Eles são interessantes para desmontar hipóteses de causalidade. Então vou colocar algumas perguntas chave. Pena que o Dr. Barnard não pode me ouvir. Quem sabe. Diabete tipo 2 é uma coisa extremamente rara no início do Século XX. No Século XIX era tão raro a ponto de ter relatos de casos em revistas médicas. O médico escrevia, “Eu atendi um adulto com diabete.” Isso era uma coisa que tinha que ser relatada, porque a maioria dos médicos em sua vida inteira jamais veria um caso de um diabético que não fosse criança.

Rodrigo Polesso: Tanto que o nome era esse.

Dr. Souto: Exatamente. O diabetes tipo 2 agora é uma epidemia. Eu passo a tarde no meu consultório vendo diabéticos. A tarde inteira. Vários. Deixe-me entender. A sociedade era vegana no Século XIX? A sociedade era vegana no início do Século XX? De repente, da metade do Século XX para cá todo mundo começou a não comer mais vegetais e a comer carne… Pessoal, é o contrário. Se comia muito mais carne no Século XIX e no início do Século XX do que agora. Quem quiser olhar, bota do Google “NHANES”. Essa sigla é um estudo epidemiológico sobre alimentação de longa duração nos Estados Unidos mostrando as tendências. O que está aumentando na alimentação americana e o que está diminuindo na alimentação americana nas últimas décadas. Vocês vão ver a carne vermelha diminuindo. Os óleos vegetais, óleos de soja aumentando. A gordura saturada diminuindo. Os carboidratos aumentando. Está tudo lá. As pessoas estão comendo mais carboidrato. Estão comendo menos gordura. Estão comendo menos gordura saturada, mas estão comendo mais óleos vegetais, estão comendo menos carne. Como pode o diabetes aumentar na população enquanto o consumo de carne diminui, se o consumo de carne é a causa da diabetes?

Rodrigo Polesso: É. Não faz sentido nenhum.

Dr. Souto: Existe uma região da Índia que é uma região onde culturalmente o pessoal é vegetariano. Não é em toda a Índia. O consumo de arroz é muito elevado naquela região. É um dos locais do mundo com maiores incidências de diabetes tipo 2. E é o local da Índia com mais diabetes tipo 2. Tem uma parte da Índia que não é vegetariana onde a incidência de diabete tipo 2 é menor. Então, se a carne é a causa do diabetes, como se explica que a porção vegetariana da Índia tenha mais diabetes? Existem vários outros exemplos epidemiológicos como esse. A epidemiologia não é boa para estabelecer causas. Ela é boa para destruir sonhos.

Rodrigo Polesso: Muito bom.

Dr. Souto: O negócio é uma peça de propaganda. De pessoas que são ideologicamente alinhadas com uma coisa filosófica. Eu não vou discutir isso. Eu já disse que não tenho problemas com uma dieta vegetariana que seja bem montada, que seja de baixa porcaria, que não seja cheia de alimentos processados e açúcar. Eles pegaram uma série de falsos argumentos que eles sabem que são falsos… Nós demonstramos isso para vocês… Para fazer como peça de propaganda. O que me inquieta um pouco é o número de pessoas nervosas, ansiosas e quase em pânico nos escrevendo. Parece que as convicções são muito frágeis. O pessoal nos ouve falar todas as semanas de estudos, ensaios clínicos randomizados, metanálises. Aí aparece um documentário do cara que segura o cartaz no piquete contra o bacon… Quem já leu, leia de novo no meu blog. Bote no Google: Souto, dieta, você tem medo de que. É isso. “Estou fazendo porque quero perder peso, mas no fundo eu sei que é uma dieta louca que vai me matar.” Então, quem sabe, vá fazer a dieta vegana do Barnard.

Rodrigo Polesso: Eu ouvi um som de uma coisa caindo aí. Foi mesmo?

Dr. Souto: Acho que foi na sala do lado.

Rodrigo Polesso: O microfone.

Dr. Souto: O microfone está quieto. Se ele caísse estaria chorando agora.

Rodrigo Polesso: O microfone do discurso. O microfone do discurso que caiu no palco.

Dr. Souto: Desculpe.

Rodrigo Polesso: Largou o microfone.

Dr. Souto: Não peguei a ironia. Esse microfone eu tenho um carinho por ele. Foi um microfone que eu levei muitos meses para comprar.

Rodrigo Polesso: Se você fosse numa boate, deixasse só o microfone dentro e apagasse as luzes, fica igual. Cheio de luz piscando. Uma coisa que pulou na minha cabeça agora falando sobre veganismo, especialmente. Na verdade, duas coisas. Agora que falei veio outra coisa em mente. Aqui perto de casa tem um café que é vegano. Não somos contra isso… Somos contra fatos mal falados e má ciência. Mas na frente desse café vegano está escrito assim: “Vegetarianismo é para criança. Seja adulto. Seja vegano.” Essa é quão forte é a religião do veganismo. Apesar de respeitar toda a filosofia que vocês tem… De respeitar completamente a opinião de que a criação de animais hoje está longe de ser como poderia ser… Não é feito de uma forma humana em sua maioria… Mas uma coisa que não posso deixar de pensar é o seguinte… Eu queria até perguntar para o Dr. Barnard. Dr. Barnard, se a gente quer voltar a ter um estilo de vida mais saudável, conectado com a natureza… Se a gente pegar um ser humano vegano e colocá-lo para viver na selva, ele vai morrer bem mais cedo. É literalmente impossível se obter vitaminas essenciais que o corpo que essa pessoa precisa. Como pode uma filosofia alimentar artificial, criada dessa forma, que causa mortalidade prematura do ser humano poder ser algo bom de ser advogado para a população geral?

Dr. Souto: Ela é um “privilégio” da sociedade do Século XXI. Onde você tem agricultura de massa, cujo o impacto ecológico é complicado. Vou deixar uma dica para o pessoal dar uma pensada. Uma vaca alimenta dezenas de pessoas por muitos dias. Mas para fazer um tofu, eu preciso matar um cem número de animais, fazendo agricultura industrial, botando spray. Aí vou ter que fazer julgamentos de valor. “Mas o camundongo que vai morrer porque botei veneno na lavoura de soja não tem a mesma importância do que a vaca.” Do ponto de vista inteligência, o camundongo está mais próximo de nós. Se for ver insetos… É preferível matar um monte de vidas para fazer um tofu e comer um troço ruim que me alimenta mal?

Rodrigo Polesso: E causa problemas…

Dr. Souto: Ou pegar uma vaca que se não fosse o fato das pessoas comerem carne, ela não teria tido a oportunidade da existência… Agora ela existe.

Rodrigo Polesso: Já estou vendo a ira nos olhos dos vegetarianos.

Dr. Souto: Ela pode ser criada pastando numa vida que, para uma vaca, é uma vida boa. Ela pasta… Tem uma sombra no capão… Descansa na sombra… De vez em quando ela lambe um sal. Ela não precisa procurar água, porque o fazendeiro deixa um negócio de água para ela beber. Em vez de ela morrer de velha quando os dentes caírem… Ir definhando de fome… Ou por ser predada por animais selvagens que vão matá-la a mordidas bem devagar, ela é morta com uma pancada na cabeça instantaneamente. É a forma melhor que qualquer herbívoro pode morrer. Nós temos que combater a criação desumana de animais em confinamento. Nós temos que combater a forma como os bichos são eventualmente transportados. É aí que a energia dos ativistas tem que ir. E não um monte de gente criada na cidade e não faz ideia da destruição ecológica que a agricultura em grande escala. Pelo menos aqui no Rio Grande do Sul nunca botou o pé no campo para ver como ovelha e vaca são criadas soltas. Estão lá feliz da vida, pegando sol, passarinho nas costas pegando carrapato… O bicho vive dois, três anos assim e morre num dia, em vez de ser estraçalhado por uma matilha de lobos.

Rodrigo Polesso: Com certeza é “food for thought”.

Dr. Souto: Eu nem queria tocar nesse assunto. Mas acabou saindo. Mas esqueçam. Faz de conta que tudo que falei é um absurdo e que tem que mais que ser vegano mesmo. Não tem que matar nenhum bicho. Ok, respeito. Mas os argumentos a serem usados, que sejam filosóficos. Mas não falsos argumentos de saúde.

Rodrigo Polesso: Perfeito. Com isso, vamos finalizando aqui. Se você se conecta com essas ideias que a gente tenta propagar aqui… Se você quer fazer parte da verdade… Verdade científica de fatos e hábitos comprovados cientificamente que ajudam nosso estilo de vida saudável. Se você quer fazer parte de tudo isso, eu te convido a assinar a Tribo Forte. Faça parte da Tribo. É uma comunidade que está crescendo dia a dia. Realmente, a energia é muito boa lá dentro. A gente só valoriza uma coisa. Alimentação de verdade e estilo de vida saudável de verdade baseado em fatos e evidência científica. Para você acessar, TriboForte.com.br. Você terá acesso a receitas também para deixar seu estilo de vida bem mais dinâmico e saboroso também. Obrigado, Dr. Souto. Foi uma conversa bastante bacana. Espero que quem precisava ouvir ouviu uma perspectiva diferente e que a gente possa ter agradado o pessoal com nosso ponto de vista. Nosso objetivo como sempre não é agradar a todos, mas mostrar o que a gente acha que é a melhor ciência… A melhor verdade que você deveria prestar atenção. Obrigado, Dr. Souto. A gente se vê no próximo episódio.

Dr. Souto: Obrigado, Rodrigo. Para os ouvintes eu vou dizer o seguinte. Pessoal, Netflix… Usem para ver filme. Usem para ver série… House of Cards, esse tipo de coisa. Ciência vocês ouvem aqui e no Pubmed. Tchau tchau.

Rodrigo Polesso: Bem dito. Tchau.